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Colocar um livro novo no mundo é sempre uma experiência de altos e baixos. Emocionante na maior parte do tempo, mas as vezes surgem uns picos de desespero. E até hoje não sei muito bem lidar com esse sobe e desce.
Este mês a Kacey Musgraves lançou um álbum novo e em uma entrevista sobre o Star Crossed que ela deu pro Zane Lowe, a Kacey fala sobre esse processo de estar quase lançando uma coisa que, por enquanto ainda é só dela. Em um determinado momento, ela comenta sobre como lançar um álbum novo é entender que daqui a pouco suas músicas terão outros “attached meanings”, ou “significados agregados” em tradução livre. As pessoas irão associar aquelas músicas à experiências pessoais e, ela não tem o menor controle sobre isso, porque o álbum não é mais dela. O álbum pertence aos outros.
Passei um bom tempo refletindo sobre isso.
Não sou muito apegado às coisas que escrevo. Juro. Tenho muito orgulho de tudo, é claro, mas nunca parei para EXPLICAR o que uma história significa ou o que um personagem quis dizer naquela cena em específico. Tudo que o leitor precisa saber está no papel, e o que ele faz com aquela história não é da minha conta. As pessoas são capazes de encontrar significados profundos em coisas que, para mim, eram apenas detalhes. E meu maior desafio como escritor é ouvir e aprender.
Lembro da surpresa que foi quando lancei Quinze dias e vi uma quantidade considerável de leitores se identificando com a Melissa (que aparece em duas cenas e quase não fala nada). Entendi então que, em 2017, existia uma carência muito grande de personagens bissexuais em livros brasileiros, que usam todas as letras da palavra para se definirem.
Daí veio o Arthur no meu livro seguinte (e ele imediatamente se tornou um dos personagens mais queridos dos leitores). E junto com o livro novo, vieram e-mails e mensagens perguntando se a Karina é assexual porque “ela tem MUITAS VIBES de ace”.
É um ciclo sem fim. O que eu escrevo não teria importância alguma sem o significado agregado dos leitores. Sem essa noção de que eles pertencem à história e a história pertence a eles.
Se a casa 8 falasse é meu livro menos e mais pessoal. Nele, não falo sobre temas tão próximos da minha vivência como auto-aceitação ou famílias religiosas, mas acho que me afastar de mim mesmo me ajudou a me aproximar de Ana, Greg e Beto, os 3 protagonistas da história. Escrever durante 2020, isolado e sozinho, foi uma experiência difícil e, de certa forma, essas três pessoas inventadas eram as únicas coisas que me davam o mínimo de vontade de acordar no dia seguinte. Porque diante de um sentimento de impotência tão grande por conta de tudo que aconteceu (e continua acontecendo) no mundo, a casa 8 estava sob o meu controle, e o que acontece ou deixa de acontecer nela, só dependia de mim.
E, sinceramente, estou contando os dias para observar de longe a Casa 8 chegando na mão de novas pessoas e ganhando significados que até então não existem na minha cabeça. Meu principal objetivo com esse livro é fazer com que todo mundo se sinta em casa, pintando as paredes como acharem melhor, arrastando os móveis e mudando de lugar, e usando essa história de acordo com suas necessidades. Para rir, para escapar, para se confortar, para passar raiva, sei lá.
A Casa 8 não é mais minha. Mas foi bom demais ficar com ela esse tempo todo.
Meu novo livro, Se a casa 8 falasse, está disponível nas melhores livrarias e ainda dá para comprar a edição com brindes exclusivos no Submarino.