Quem me acompanha em qualquer rede social sabe que eu estou a literalmente dois anos falando “não, porque quando eu terminar de escrever meu livro” e essa ladainha pode parecer cansativa para quem vê. E, acredite, é ainda mais cansativa para mim, que preciso ficar nesse sobe e desce emocional onde em um dia eu me sinto capaz de TUDO e no dia seguinte eu tenho certeza de que nunca mais vou conseguir escrever nada.
Acho que meu começo foi atípico e isso me deixou mal acostumado. Lancei Quinze dias em 2017 e, praticamente um ano depois, Um milhão de finais felizes chegava às livrarias. Um livro por ano me parecia uma EXCELENTE ideia. Mas acabei descobrindo que, com a vida que eu levo, e as obrigações que tenho hoje, isso seria praticamente impossível. Estamos em Agosto de 2020 e até agora não saiu nada.
Toda vez que começo a pensar em um livro novo, crio uma pasta para o projeto do meu Drive e, dessa forma, tenho um registro de todas as minhas tentativas ao longo dos últimos dois anos. É ótimo e deprimente ao mesmo tempo.
No texto de hoje decidi compartilhar um pouco do meu processo de tentativa e erro e concluir meus pensamentos com uma epifania que tive no fim de semana enquanto escrevia (não é nada muito revelador, por favor não crie expectativa).
Vamos de viagem no tempo. UMDFF foi publicado em Julho de 2018 e, depois disso, eu ainda não havia começado mais nada! Eu tinha um universo de possibilidades para explorar!
23 de julho de 2018
Criei a pasta “Adolescentes robôs” que é simplesmente a ideia mais absurda que eu já pensei que seria capaz de escrever. Desisti porque precisava pesquisar muitos tipos diferentes de metal e quanto mais fundo eu ia no outline, mais eu percebia que só estava escrevendo um romance normal e o fato dos protagonistas serem metade humanos metade robôs não acrescentava em nada. Deixei a ideia para depois, para um futuro onde eu tivesse uma noção mais clara a respeito de robôs e do papel deles nessa história.
28 de agosto de 2018
Criei a pasta “Menino” um dia depois do resultado das eleições presidenciais. Eu estava emocionalmente destruído e prometi que iria usar toda aquela raiva como combustível criativo e escrever uma história séria e política (risos ao fundo). Planejei todo o outline, a história envolvia uma morte importante, que não poderia ser imediata mas precisava ser fatal. Mandei mensagem para ex (que é médico) perguntando o que pode deixar uma pessoa inconsciente por umas duas horas antes de matar. Ele me deu uma bronca dizendo que não se pergunta esse tipo de coisa sem contexto. Ficou um clima meio esquisito. Deixei a ideia para depois porque não me sentia preparado para escrever sobre morte.
04 de fevereiro de 2019
Criei a pasta “Lagoa Pequena”, que é o nome de uma cidade inventada onde essa história acontecia. Essa aqui eu levei adiante. Muitos personagens, histórias entrelaçadas, eu já tinha até um BOM TÍTULO escolhido para ela. E, o melhor, eu estava recuperado emocionalmente. Eu achava que a situação no país não tinha como piorar (gargalhadas intensas ao fundo), e não deixaria aquilo me abalar de jeito nenhum. Me abalou. Voltei a querer escrever sobre morte. Nessa época tudo que eu tentava planejar envolvia alguém que morreu, ou alguém prestes a morrer, ou alguém que morreria durante a história. O planejamento inicial desse livro tinha os três. Uma desgraça. Deixei a ideia pra depois mais uma vez.
31 de julho de 2019
Criei a pasta “Viagem no tempo”. Eu queria voltar para a ficção científica mas sem nenhum compromisso com a ciência. Assim como os adolescentes robôs, essa era mais uma história sobre dois garotos se apaixonando, mas não vou falar muito sobre ela porque essa aqui, com o perdão do trocadilho, acho que tem futuro. Preparei um outline completo, descrevi todas as cenas, escrevi um epílogo que gosto muito e deixei pra lá sem motivo aparente. Provavelmente porque sou irresponsável e inconsequente (e acho que eu estava triste na época por algum motivo).
Uma pausa para pensar
Naquela altura, Um milhão de finais felizes já completava um ano de publicação e, diferente do que eu imaginei, não tinha um livro novo pronto. Nem nada perto disso. Eu só tinha 4 ideias começadas e não gostava de nenhuma delas. Decidi parar para pensar no que eu queria que meus livros significassem. Fiz um exercício comigo mesmo. Naquela época eu tinha acabado de ler três livros que me deixaram obcecado e eu falava sobre eles sem parar. Eles eram:
- As desventuras de Arthur Less, de Andrew Sean Geer
- Like a Love Story, de Abdi Nazemian
- Os sete maridos de Evelyn Hugo, de Tailor Jenkis Reid
Era meio desesperador como, um atrás do outro, eu havia lido três livros que mudaram minha vida de alguma forma. Eu sentia que jamais seria capaz de escrever nada bom novamente, mas decidi tentar usar aquelas histórias como incentivo pra mim e listei o que aqueles livros tinham em comum para me atraírem e mexerem tanto comigo. No fim das contas, cheguei a conclusão de que eu gostava de histórias que acompanhavam o protagonista por muito tempo, que falavam sobre vivência LGBT através dos tempos, que cruzava gerações ao longo da narrativa e apresentava amores impossíveis. Juntei esses elementos e segui em frente!
12 de agosto de 2019
Juntando tudo isso e o meu amor pela história de Lagoa Pequena, criei a pasta “Lagoa Pequena 2.0”, que trazia mais ou menos a mesma história da primeira versão, dessa vez com menos mortes e mais diversão!!! Eu me sentia imbatível! Essa história tinha tudo que eu sempre quis escrever. Uma cidade pequena, relacionamento entre irmãos, um romance improvável, um cachorro de três patas. Não tinha como dar errado. Mas deu.
20 de setembro de 2019
Assim como você que está lendo esse texto, eu já estava cansado. Ao longo de todas essas tentativas, eu já tinha escrito centenas de milhares de palavras. Tinha projetos quase completos, mas nada me parecia bom o bastante. Eu me cobrava demais (ainda me cobro), e o medo de escrever algo que eu fosse me arrepender no futuro me deixava travado, sem forças pra continuar. Chutei o balde. Cansei de tentar mudar o mundo com o que eu escrevia e decidi arriscar uma comédia romântica! Então eu criei a pasta “Fred & Fred”. Nos primeiros meses, escrevi loucamente. Todos os dias depois do trabalho, sem falta. Duas mil palavras por dia no mínimo. Eu estava muito empolgado porque aquele era um livro feito para as pessoas rirem!!!! Eu estava confiante. A gente divulgou esse livro. Eu não poderia estar mais feliz e quanto mais feliz eu ficava, mais eu escrevia. Porque esse era o combustível de Fred & Fred: FELICIDADE.
24 de março de 2020
Início do isolamento social por causa da pandemia de Coronavírus. Lançamento de Animal Crossing: New Horizons. Tirei um mês pra descansar a cabeça e caí em um buraco difícil demais de sair.
15 de maio de 2020
Abril foi um mês nulo, onde eu literalmente não fiz nada da minha vida além de jogar Animal Crossing. Eu jurava que a pandemia passaria rápido e, bem, se você está lendo esse texto no dia em que eu escrevi (3 de Agosto de 2020), sabe que não passou. Então em maio decidi acordar pra vida e tomar decisões. Fred & Fred deixou de fazer sentido justamente por ser um livro feliz demais, e foi assim que criei a pasta “Casa 8”, que alimento diariamente com um pouquinho dessa história que já estou escrevendo há quase 3 meses.
No último fim de semana criei um cachorro para história e, assim como o cachorro de Lagoa Pequena, decidi que ele teria três patas. Roubei uma piada que estava escondida no segundo capítulo de “Adolescentes robôs”, sem nunca mais ter visto a luz do dia. Peguei também uma cena de beijo que eu havia planejado para “Lagoa 1.0”, e uma conversa entre irmãos planejada para “Menino” e quanto mais eu mexia nos meus projetos engavetados, mais eu me dava conta de que nesses dois anos eu fiz coisas. Posso não ter concluído nenhuma delas, mas elas ainda são histórias, e são minhas. E eu posso usar quando bem entender. Prometi a mim mesmo que não falaria muita coisa sobre Casa 8 mas, enquanto escrevia esse post, percebi como esta história tem um pouco de cada coisa que tentei produzir (menos “Viagem no Tempo”, que um dia vai virar uma história bem legal), e deu até pra sentir um certo orgulho? Pode ser que daqui a dois meses essa ideia vá para o ralo porque apareceu uma melhor ou porque estou triste demais, sei lá. Eu sempre invento umas desculpas horríveis. Mas têm dias em que eu só quero dormir com a consciência limpa por pelo menos estar tentando, sabe? E hoje eu quero dormir assim.
6 respostas para “Estou tentando”
Ler suas postagens aqui (ler você no geral) é sempre ler sorrindo um pouquinho. Obrigada ❤
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Vitor você é perfeito e se você lançar um livro de receitas eu vou consumir e ainda sim me sentir inspirada.
Tentar sempre é válido porque é melhor o feito do que o perfeito. Um abraço quentinho ❤
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Você é incrível. Só isso, espero que tenha uma ótima noite.
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Vitor, você é incrível! Não se cobre tanto, todos tem seu tempo e o processo criativo é complicado. Em 2016 eu li 50 livros, 2017 foram 30, 2018 foram 5 e 2019/2020 foram 2. Os seus estão aqui, eu não deixo de ler, pretendo melhorar mas eu entendo que tô num momento diferente da minha vida em 2016, com prioridades diferentes, e tudo bem. No momento certo vai rolar, só não deixa de tentar. Bj é boa sorte!
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Oi Vitor,
Estamos numa confusão de sentimentos esses últimos tempos. E imagino que para quem faz arte é muito maior.
Tenho acompanhado você a um bom tempo, e sempre acreditei no seu trabalho e o quanto ele transformaria pessoas. E foi isso que aconteceu… Na verdade acontece.
Sei que suas histórias vão tomar forma em breve e estarão nas mãos de pessoas que também se apaixonarão da mesma forma.
E o tempo?
Deixa que ele cuida do resto.
Você está tentando e acho que é tão relevante nesse processo, que quando terminar, a jornada tmb será tão importante quanto a história.
Estaremos aqui, esperando, tranquilamente, enquanto você produz no seu tempo.
Ah, e se um dia tiver vontade, conte as suas jornadas pela escrita, em livros também, tenho certeza que elas irão inspirar mais jovens que tem os mesmos medos e anseios que você.
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vitor, várias tentativas imperfeitas são melhores do que nenhuma tentativa perfeita (mesmo que pareça conselho de autoajuda barata, pique Karina)
não importa o que você escrever, eu vou ler, me inspirar e, provavelmente, chorar, pq a vida tem dessas
ansiosa pra gays envolvidos com viagem no tempo! yay!
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